10.19.2004

PLE apresenta - A verdadeira história de Manuel da Silva - a peça que faltava

A verdadeira história de Manuel da Silva - a peça que faltava


O morto e a morte:

- O meu nome é Manuel, e estou morto. Mortinho da silva. É bom ver todos aqueles que gosto aqui à minha volta. Nasci a treze de fevereiro, e a treze de fevereiro devia morrer. Não que eu quisesse, mas porque o destino assim o quis. Fechou-se o círculo. Aos sete anos, montei uma cabana que caiu de 15 metros comigo lá dentro, depois de ter roubado o bolo de aniversário e aí o ter escondido para o comer sozinho. Por milagre não morri. Aos dezasseis anos, depois do almoço do meu aniversário, fui ao rio tomar banho e parou-me a digestão. Foi o meu cão que me puxou para terra e chamou os meus pais. Aos 23, quando voltava da viagem de finalistas, o avião caiu, e fui um dos três sobreviventes. Cheguei a pensar que à terceira era de vez. Porque não tendo morrido na terra fiquei com um ferro espetado durante cinco dias na cabeça, a escassos milímetros do cérebro. A morte continuava a brincar comigo. Julgava-me invencível, eterno, resistente a tudo. Bem, não é bem assim. Quem diria que eu ia morrer desta maneira. Sinceramente...
- Como todos os anos, cheguei a casa a horas. Sabia que ás nove me iria encontrar, ainda que à distância, com as minhas salvadoras. Essas queridas... Depois de tomar banho, vesti o meu robe vermelho, e fui para a sala. Peguei nas garrafas para comemorar, e levei as prendas das minhas amigas, para que elas partilhassem o momento em que as abria. Pousei as garrafas, tirei as prendas do bolso e sentei-me. Liguei os televisores onde as via. Parecia que me desejavam os parabéns. Não sabia que prenda abrir primeiro. Decidi-me pelas duas. Com muito custo e habilidade consegui. Agora a parte mais fácil: cortar a maçã que a Madalena me deu e espetar a colher no pastel de nata oferecido pela Diana. A minha mãe sempre me disse que para ter uma boa digestão devia comer primeiro os doces e depois a fruta. Mas eu preferia ficar com o sabor doce na boca. Não me conseguia decidir. A maçã ou o pastel? Olhei para as televisões em busca de resposta. Elas sempre me acompanharam, elas deviam saber... Nisto começou a Formula 1 . Eh! Como eu queria ver esta corrida!
- Deixei a escolha para depois. Nada melhor! Na minha sala, ás escuras, a ver Formula 1. Não me podiam dar melhor prenda. Recostei-me no sofá, nesse momento perfeito. À terceira volta, uma ultrapassagem mal calculada lança o carro contra o cameraman. A velocidade era vertiginosa.
- Coitado! Ele vai morrer... Cada vez está mais perto, mais perto..., ainda mais perto.... não tem escapatória... O quê?! Está a vir contra mim??!!! Está a entrar na minha sala. Vai-me atropelar!!! Estou feito!
- Quando estou mesmo a despedir-me de tudo, eis que a experiência do piloto fala mais alto. Trava mesmo em cima de mim, ainda que derrubando a mesa. Ouço um grito de aflição, de horror.... O meu sofá está-se a mexer. Mas o carro não lhe tocou. Foi ele que ganhou vida! Sinto as costas do sofá a esmagarem-me... não consigo respirar... é o fim... devorado por um sofá...
- Quem me mandou comprar uma televisão interactiva....